Em reunião virtual na terça-feira, 1º, a comissão especial da Câmara dos Deputados que analisa projeto de lei sobre medicamentos formulados com cannabis (PL 399/15) ouviu mães de pacientes que já fazem uso desse tipo de medicamento e também representantes de entidades que tratam do assunto. O relator do projeto que autoriza o plantio de maconha no país para fins medicinais, deputado Luciano Ducci (PSB/PR), apresentou parecer favorável à proposta.
O projeto, de autoria do deputado Fábio Mitidieri (PSD/SE), apresentado em 23 de fevereiro de 2015, altera a Lei 11.343/06, que institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas, para viabilizar a comercialização de medicamentos que contenham partes da planta cannabis. Pela proposta, o plantio será feito por empresas farmacêuticas e de pesquisa e o comércio só poderá ocorrer se existir comprovação de sua eficácia terapêutica atestada em laudo médico para todos os casos de indicação de seu uso, e apenas com autorização da Anvisa.
Veja aqui a tramitação do PL 399/15, na Câmara, e aqui, a íntegra do projeto.
A presidente da Associação de Cannabis e Saúde (Cultive), Maria Aparecida de Cavalho, é mãe da Clárian, que tem síndrome de Dravet, uma epilepsia severa com risco de morte súbita. “É inegável a transformação que a maconha fez na vida da minha filha, diminuindo 80% das crises, diminuindo a sudorese depois de quatro meses tomando o óleo, melhorou o cognitivo, a coordenação motora, minha filha está se alfabetizando, melhorou a vida de todos da família. Realmente, sem a maconha, eu não teria a minha filha aqui hoje”, contou.
Desde 2014, o Conselho Federal de Medicina autoriza a prescrição de remédios com canabidiol. No ano seguinte, a Anvisa retirou a proibição do uso de canabidiol e, em 2016, autorizou remédios com THC. Em 2017, ocorreu o registro do Metavyl, à base de cannabis. E, a partir de 2020, a venda de produtos com cannabis em farmácias passou a ser autorizada. O plantio do produto, no entanto, continua proibido. E a autorização para importação de remédios é cara e exige uma série de documentos.
“Art. 2º. O art. 2º da Lei nº 11.343, de 23 de agosto de
2006, passa a vigorar acrescido do seguinte § 2º, renumerando-se o atual
parágrafo único para §1º:
Art2º…………………………………………………………………
………………………………………………………………………..
§2º Os medicamentos que contenham extratos,
substratos, ou partes da planta denominada Cannabis
sativa, ou substâncias canabinoides, poderão ser
comercializados no território nacional, desde que exista
comprovação de sua eficácia terapêutica, devidamente
atestada mediante laudo médico para todos os casos de
indicação de seu uso. (NR)”
Acesso aos remédios
Liane Maria Pereira é a mãe da paciente que obteve o primeiro habeas corpus no Rio Grande do Sul para usar cannabis medicinal. O desejo dela é que o medicamento seja acessível a todos que precisam. “Nós não temos como sair de consultório médico com uma receita e esperar meses ou anos para ter essa medicação. Tem que ser como qualquer receita. Temos que ter direitos para dar essa medicação logo a nosso filho e nosso paciente. A voz das associações é muito importante, né?”.
As associações foram a forma encontrada para viabilizar o acesso a medicamentos de elevado custo, como é o caso daqueles feitos à base de canabidiol. A Associação Brasileira Cannabis Esperança (Abrace) é uma delas, como explica o representante Cassiano Teixeira. “A Abrace hoje fornece o acesso para 8 mil pacientes, entre eles mil pacientes que não pagam um real. Temos fornecidos alguns casos judiciais para o SUS, creio que são seis casos já. Temos 17 pesquisas sendo realizadas na Abrace, inclusive três pesquisas com Covid”, disse.
Dependência química
Mas o projeto que autoriza o plantio de maconha no país para finalidades medicinais não é unanimidade. A representante da ONG Amor Exigente, que orienta 1 milhão e 200 mil famílias de dependentes químicos por ano, Janicleide Xavier, teme que a proposta possibilite a ampliação do uso da maconha. Ela conta que perdeu o filho há três anos, depois que ele passou a usar maconha para acabar com dores de cabeça insistentes. “Ele teve surtos psicóticos, teve sua primeira internação e foi diagnosticado com esquizofrenia após fumar maconha. O que me preocupa é que, no nosso Brasil, as pessoas não estão preparadas para achar que o remédio pode ser usado para fins medicinais. Brasileiro sempre dá um jeito de fazer gambiarra com tudo”, lamenta.
O coordenador da Frente Parlamentar em Defesa da Vida e da Família, deputado Diego Garcia (Pode/PR), concorda e se revolta diante da possibilidade de a proposta ser votada durante uma pandemia. “Com a receita, você vai poder fazer uso. É de uma irresponsabilidade tremenda num momento como esse, da pandemia, nós estarmos levando para Plenário uma discussão que sequer passou por uma comissão especial”.
“(…) o objetivo central do presente projeto é permitir que a sociedade brasileira possa ser beneficiada, quando essencial e necessário ao tratamento de determinadas
patologias, com o uso de apresentações farmacêuticas que tenham na sua
fórmula a Cannnabis sativa, ou partes dela, ou ainda de canabinoides dela
derivados. Em outras palavras, o projeto busca viabilizar o uso lícito dos
medicamentos que tenham como princípio ativo substâncias oriundas da
maconha.” (Trecho da justificativa do projeto).
A proposta
O projeto de lei permite o cultivo de sementes ou mudas certificadas e plantas com até 1% de THC, portanto não serão ativas. O texto também proíbe o comércio da planta, chá ou sementes.
O ex-diretor da Anvisa William Dib acha que a proposta uniu o que há de melhor nas legislações do mundo inteiro e dá segurança às empresas para produzir e dar acesso aos medicamentos.
O relator da proposta, deputado Luciano Ducci, explica que seu texto estabelece o uso desse tipo de medicamento apenas em casos de pacientes que não responderam bem a outras terapias ou tiveram efeitos colaterais com medicamentos disponíveis no mercado. Ele lembra que a Lei 11.343/06 permite à União autorizar o plantio de vegetais como a cannabis para fins científicos ou medicinais, em local e prazo determinado, mediante fiscalização. Segundo ele, o projeto apenas regulamenta a legislação vigente. “A gente espera poder, com esse projeto, ter um marco novo de regulação da cannabis no Brasil. É um projeto que está muito seguro e que tem consistência muito boa para ser um marco nesse país”, afirmou.
Se aprovado pela Câmara, o projeto ainda precisa ser analisado pelo Senado.
Fonte: Agência Câmara de Notícias
Foto: Maj. Will Cox/Georgia Army National Guard/Agência Câmara de Notícias
1 comentário
Se houver um controle do poder público, acredito que pode funcionar para as pessoas que necessitam da medicação.
O maior problema é a falta de políticas públicas para o controle desse tipo de medicação, hoje Como é importada fica difícil para fins alucinógenos. Vamos esperar para ver esse controle.