Thomaz Nogueira (*)
O mundo é complexo, as pessoas são diferentes umas das outras. Têm escolhas distintas.
Tem gente na Ucrânia que apoia a ação militar da Rússia, apesar das mortes, da desestruturação social, do caos econômico. Tudo pode desaparecer, mas apoiam. Será limitação intelectual, mera subserviência? Não sei, mas sempre tem. Hoje, esses quintas-colunas são uma preocupação real da defesa ucraniana.
Tem gente em Manaus que apoia o Decreto do Bolsonaro que altera o IPI, sem considerar a especificidade de produzir no meio da floresta e seus custos logísticos elevados. Apoia, sem considerar a morte dos empregos, a desestruturação social, o caos econômico. Será limitação intelectual ou mera subserviência a Bolsonaro? Não sei, mas sei que devemos ignorar os quintas-colunas e lutarmos.
Alguns desavisados repetem mecanicamente que nos tornamos dependentes do PIM e nos acomodamos. Menos verdade.
Três pontos a destacar. Primeiro, essa crítica traz subliminarmente a noção que a produção industrial da Zona Franca é algo danoso economicamente. Não é. A produção em Manaus agrega tecnologia produtiva atualizada, produz e capacita mão-de-obra, não apenas de chão de fábrica, mas de tecnologia de gestão. Segundo, é um modelo dinâmico que responde aos movimentos da economia mundial, sem ele essa produção estaria em algum outro ponto do planeta, provavelmente em outra zona econômica favorecida. Terceiro, e tão importante quanto, há muito levantamos a questão de adicionarmos à matriz econômica outras atividades, descentralizadas geograficamente, inclusiva da utilização de insumos regionais. Isso já é consenso nos que discutem o futuro econômico do Estado, não ficamos parado. Mas a noção que nos acomodamos com o PIM e ficamos paralisados é falsa.
Já abordei esse ponto específico, outras tantas vezes: É mais fácil falar do que fazer. Esse desafio de desenvolver as potencialidades regionais não é só do Amazonas, mas de todos os Estados amazônicos. Se fosse fácil fazer, já teriam feito.
Qual o caminho? Ter prioridade nessa diversificação. Mas a diversificação vem pelo adicionar e não pelo substituir. O PIM é o mecanismo que vai nos dar nas próximas duas décadas os meios e recursos para esse processo de adição à matriz produtiva. Ignorar esse ponto fulcral é o erro maior do atual governo.
Tendo criticado tanto Paulo Guedes que vou defendê-lo um pouco. Paulo Guedes não é mal-intencionado, é apenas limitado por uma visão econômica esquemática vencida. Ele não é mal-intencionado, apenas não fez o dever de casa de conhecer efetivamente as qualidades e fraquezas do modelo de produção industrial na Zona Franca. O que salvava até agora é que uma outra limitação dele na capacidade de gestão, o fazia inoperante, ele não entregava resultados. Mesmo as reformas havidas no período, boas ou más, devem ser colocadas na conta do Congresso e não de qualquer iniciativa do governo.
Paulo Guedes nem aproveita as ideias com que o liberalismo pode contribuir para o dinamismo da economia. Sua visão liberal livresca, somada ao descaso em conhecer o modelo, leva ao raciocínio preguiçoso que “tem de acabar com aquela produção ali no meio da Floresta, trazer para o lado do mercado”. Enquanto estava na inércia da limitação gerencial, tudo bem, mas agora mudou. O decreto é um elefante numa loja de cristais. Acompanha um instante.
A gente sabe da classificação de Napoleão sobre os 4 tipos de soldado: Inteligente sem iniciativa, idiota sem iniciativa, inteligente com iniciativa e idiota com iniciativa, sendo o último o mais perigoso e danoso. Você decide, você escolhe.
Para ajudar na sua decisão tem um questionamento a ser respondido: O decreto causa mesmo dano ou será que não é ousado e tem algo benéfico?
Vamos analisar forma e mérito: O IPI é o principal imposto federal na cesta de incentivos da produção em Manaus, não excepcionar o que produzimos, reduz a competitividade da indústria local. PONTO INCONTESTÁVEL. Se vai matar ou ferir é um detalhe. Portanto não é positivo em si mesmo. Deve, sim, impactar nos empregos. não apenas os mais de 500 mil empregos a ela vinculados direta ou indiretamente, mas toda a roda da economia amazonense, do varejo à costureira, advogado, médico, vendedor de picolé.
“Ah, mas isso faz parte da estratégia de evolução da economia Amazonense.” energumentarão alguns. O caminho da evolução é criar as condições para o outro tipo de produção e não matar o atual sem ter algo ainda produzindo resultados.
O fato é que Bolsonaro nada fez para induzir, estruturar, incrementar a diversificação econômica do Estado, mas começa por destruir o que há, e pretende colocar no lugar algo que já está aí há algum tempo e vai produzir resultados em, no mínimo, uma década. Paulo Guedes diz que o futuro é o mercado de carbono, como se isso fosse novidade. O esforço para a definição do mercado de carbono contou com a participação ativa das lideranças locais na discussão mundial. Virá? Acredito que sim, não na dimensão esperada. Mas não virá imediatamente, não substituirá os postos de trabalhos existentes.
Mais que isso, Paulo Guedes afirmou que a “redução seria de 50%, mas ficamos em 25% por causa da Zona Franca de Manaus, nada faremos em 2022 e 2023.” Duvido que haja declaração mais desastrosa.
Primeiro jogou a sociedade brasileira contra Manaus. Segundo, causou um dano à confiabilidade, monumental. Não é o dano da perda de competitividade imediata, é o dano à confiabilidade. Ainda que revertido, fica a insegurança jurídica. Mas MAIS IMPORTANTE desvela o plano de Bolsonaro para em 2024 (se no governo estiver) de aprofundar o dano. Os que estão sentados na direção mundial dessas empresas olham com horror o ambiente de negócios no PIM, analisar é a obrigação deles. Ficou mais barato, menos arriscado atender, acessar o mercado brasileiro por outra unidade produtiva, que não Manaus. E não pensem que é outro ponto do território brasileiro. A Pepsi não saiu de Manaus e foi para o sudeste, foi para o exterior.
Não temos escolha, é nos unirmos e lutarmos. Coloquemos os egos na gaveta, ignoremos os quintas-colunas e vamos oferecer soluções técnicas. E com inteligência. Reduzir o IPI é algo que interessa à indústria, reduzir a carga tributária é algo que todos buscam. Não precisamos, e não estamos, nos colocar contra o Brasil. Há caminhos que ajudam a Indústria nacional e preservam o PIM.
Minha primeira sugestão é utilizar o PPB – Processo Produtivo Básico como fator de distinção do tratamento tributário. Para você que está preocupado com a questão, mas é leigo, explico.
Em uma visão simplificada, lhes digo que para produzir em Manaus é preciso observar uma série de regras. Há um limite do que pode ser importado para o produto, há exigência de compras de insumos no mercado nacional, há exigência de etapas de efetiva industrialização, transformação, exigências de investimentos e por aí vai. Isso é o PPB, que é específico para cada produto. Para produzir fora de Manaus, não tem o incentivo, mas não tem essas exigências. Portanto, o PPB é o traço distintivo da produção incentivada do PIM. Portanto usemos esse traço distintivo.
O que for obrigado a PPB terá um tratamento tributário diferenciado. Pode ser uma regra, no próprio decreto, de simples exclusão da redução dos produtos para os quais existe PPB definido. Pode ser mais complexo com a geração de um crédito fiscal adicional a ser abatido nos demais impostos federais. Há caminhos? Há. Precisa haver o diálogo, o convencimento técnico e a vontade política.
(*) Consultor Tributário, exerceu cargos como Secretário da Receita, Secretário de Planejamento do Amazonas e Superintendente da Suframa
1 comentário
Esse governo jamais vai destruir a zona franca de Manaus. Não passarão. Fora bolsonaro, fora paulo guedes, vocês não tem competência.