O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou o arquivamento de pedido de investigação apresentado pelo deputado federal eleito Nikolas Ferreira (PL/MG) contra o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, por suposta omissão nos atos antidemocráticos do último dia 8.
Na representação, Ferreira alegava haver indícios de que Dino tinha prévio conhecimento sobre os ataques ocorridos aos prédios do Palácio do Planalto, do Congresso Nacional e do STF. Sustentava que a informação teria chegado ao ministro por diversos órgãos internos do governo federal, como a Agência Nacional de Inteligência (Abin), além de ter sido amplamente divulgada pelos meios de comunicação, notadamente nas redes sociais. Apontava assim a necessidade do afastamento cautelar do ministro e/ou a decretação de outras medidas cautelares.
Sem indícios
Segundo o ministro Alexandre de Moraes, não há nos autos indícios mínimos da prática de crime por parte de Dino nem a indicação de meios, tempo e lugar em que supostas condutas teriam sido realizadas. No entendimento do minitro, não existe qualquer outra informação relevante que justifique a instauração de inquérito.
O ministro destacou ainda que a instauração ou a manutenção de investigação criminal sem justa causa constitui injusto e grave constrangimento a pessoa investigada.
A justa causa é exigência legal para a instauração e manutenção de investigação criminal e consubstancia-se pela somatória de três componentes essenciais:
(a) TIPICIDADE (adequação de uma conduta fática a um tipo penal);
(b) PUNIBILIDADE (além de típica, a conduta precisa ser punível, ou seja, não existir quaisquer das causas extintivas da punibilidade); e
(c) VIABILIDADE (existência de fundados indícios de autoria).
Na presente hipótese, não se verifica nos autos indícios mínimos da ocorrência de ilícito criminal, não existindo, portanto, na presente petição, nenhum indício real de fato típico praticado por qualquer requerido (quis) ou qualquer indicação dos meios que o mesmo teria empregado (quibus auxiliis) em relação às condutas objeto de investigação, ou ainda, o malefício que produziu (quid), os motivos que o determinaram (quomodo), o lugar onde a praticou (ubi), o tempo (quando) ou qualquer outra informação relevante que justifique a instauração de inquérito ou de qualquer investigação (JOÃO MENDES DE ALMEIDA JÚNIOR. O processo criminal brasileiro, v. II, Freitas Bastos: Rio de Janeiro, 1959, p. 183).
A instauração ou manutenção de investigação criminal sem justa causa constituem injusto e grave constrangimento aos investigados, como bem demonstrado na lapidar lição do Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, nos autos do Habeas Corpus nº 80.564:
‘Estamos todos cansados de ouvir que o inquérito policial é apenas um ‘ônus do cidadão’, que não constitui
constrangimento ilegal algum e não inculpa ninguém (embora, depois, na fixação da pena, venhamos a dizer que o mero indiciamento constitui maus antecedentes: são todas desculpas, Sr. Presidente, de quem nunca respondeu a inquérito policial algum). Mas é demais dizer-se que não se pode sequer examinar o fato sugerido, o fato apontado, e impedir a sequência de constrangimentos de que se constitui uma investigação criminal – seja ela policial ou seja, no caso judicial – sobre alguém que, à primeira vista, se evidencia não ter praticado crime algum, independentemente de qualquer juízo ético a fazer no caso. A jurisprudência do Supremo Tribunal – é certo que afirmada em uns poucos casos e por motivos evidentes -, tem sido sensível a necessidade de proteger pelo habeas corpus situações de evidente atipicidade do fato investigado. Recordo, além dos já referidos, esses Habeas corpus: 80.204, relator, o Ministro Maurício Correa; 64.373, relator, o
Ministro Rafael Mayer; 63.523, relator: o Ministro Francisco Rezek; 67.039, relator, o Ministro Moreira Alves, e o 68.348 de que fui relator).Dessa maneira, verifica-se a ausência de justa causa para a tramitação do presente procedimento (Inq. 3815 QO/SP, Rel. Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, 10/02/2015; Inq. 3847 AgR/GO, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira Turma, 07/04/2015; Pet 3.825-QO/MT, Rel. p/ o acórdão Min. GILMAR MENDES; HC 106.124, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, 22/11/2011).
Diante do exposto, em razão da ausência de indícios mínimos da ocorrência de ilícito penal, DETERMINO O ARQUIVAMENTO imediato desta representação, nos termos dos arts. 21, XV, e 231, § 4º, do RISTF.Intime-se com cópia da decisão o representante e o representado.
Publique-se.
Brasília, 12 de janeiro de 2023.
Ministro ALEXANDRE DE MORAES
Relator
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Fonte: STF
Foto: Valter Campanato/Agência Brasil
Edição: César Wanderley/Amazonas no Congresso